sexta-feira, 8 de junho de 2012



Namorado: ter ou não, é uma questão

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não renumeradas
de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. difícil
porque namorado de verdade é muito raro. necessita de
adivinhação, de pele, de saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou
filosofia.
Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão é fácil,
mas namorado mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o
mais bonito, mas aquele a quem se quer proteger e quando se
chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo
proteção. A proteção dele não precisa ser parruda, decidida, ou
bandoleira: Basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição.
Quem não tem namorado não é quem não tem um amor: é quem não
sabe o gosto de namorar. se você tem três pretendentes, dois
paqueras, um envolvimento e dois amantes, mesmo assim pode não
ter namorado.

Não tem namorado quem não sabe o gosto da chuva, cinema sessão
das duas, medo do pai, sanduiche de padaria ou drible no trabalho.
Não tem namorado quem transa sem carinho, quem acaricia sem
vontade de virar sorvete ou lagartixa e quem ama sem alegria. Não
tem namorado quem faz pactos de amor apenas com a infelicidade.
Namorar é fazer pactos com a felicidade, ainda que rápida,
escondida, fugida ou impossível de durar.
Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho
escondido na hora em que passa o filme; de flor catada no muro e
entregue de repente; de poesia de Fernando Pessoa, Vinicius de
Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar, de gargalhar quando
fala junto ou descobre a meia rasgada; de ânsia enorme de viajar
para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado,
tapete mágico ou foguete interplanetário.
Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, fazer sesta
abraçado, fazer compra junto.

Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de
ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos
dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor.
Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do
amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira d'agua, show
do Milton Nascimento, bosque enluarado, ruas de sonhos ou
musicais da metro.
Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não
dedica livros, quem não recorta artigos, quem não se chateia com o
fato de o seu bem ser paquerado.
Não tem namorado quem ama sem gostar, quem gosta sem curtir,
quem curte sem aprofundar.
Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de
repente no fim-de-semana, na madrugada ou no meio-dia de sol em
plena praia cheia de rivais.

Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar;
quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir com
ele.
Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho, não ri de si
mesmo e quem tem medo de ser afetivo. Se você não tem namorado
porque descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos
de grilos e de medo, ponha a roupa mais leve e passeie de mãos dadas
com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras, e escove a alma com leves
fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado saia do
quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de
caqui e sorria lírios para quem passe debaixo da sua janela. Ponha
intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fadas.
Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse
uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer
frases sutis e palavras de galanteria. Se você não tem namorado é porque
ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e
de repente parecer que faz sentido. Enlou-cresça.

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